Sob essa claridade

Dançar até chegar a terra sem males

quinta-feira, novembro 03, 2005

Imaginario Estagnado

O humano comum e civilizado, que teve uma educação regular, quando perguntado sobre cultura, tende em geral a imaginar algo estático, congelado no tempo. Mesmo a propria cultura em qual está imerso é entendida como (ou tem elementos supostamente) sempre presentes, mas é mais notável nas culturas em que ele não está inserido, ou não se entende como inserido.

Isso se dá, provavelmente, apartir da distância que o ser humano médio se coloca daquelas outras culturas. Nada mais natural, quando a cultura em questão está em uma pequena ilha do outro lado do globo, como o Japão em relação ao Brasil. A distância geografica impede que se vivencie propriamente aquela cultura e por tanto, justifica as lembranças que o turista médio traz, como a pequena boneca de porcelana usando um kimono ou uma gravura caracteristica. Boneca que não é mais feita artesanalmente, mas em série, e gravura que não passa de uma reprodução de estilo, pintada com tintas e sob um papel que não condizem em nada com o momento histórico que ela tenta reproduzir (quando não é impressa). O turista médio, porém, se preocupa mais com o valor idealizado da obra, simbolo tradicional da cultura visitada, reconhecivel por qualquer outro ser humano médio. Um outro turista brasileiro no japão, que esteja imerso em determinados grupos que recebem produtos cultura, vai voltar com alguns mangás (quadrinhos japoneses, gravuras impressas com o estilo atual) que são igualmente caracteristicos do japão, e talvez um ou outro garage kit (a mesma boneca só que de fibra de vidro e usando roupas da moda atual japonesa -- essa sim feita manualmente).

O mesmo brasileiro médio entende sua cultura a partir do presente, universalmente. Politica sempre foi um mar de lama, por exemplo. E o brasileiro vai ser sempre o povo do 'jeitinho'. Ambos conceitos são miticas pós anos 50. Talvez isso se deva a uma natural incapacidade humana de entender a dimensão temporal. Mas talvez essa incapacidade não seja unicamente temporal e tão pouco, natural.

Quando encontramos o artesanato indigena, nascido nesta terra tanto quanto o samba, o que justifica que esperemos desses indios, os mesmos que vestimos e ensinamos português (eventualmente extinguindo suas linguas originais no processo), o mesmo tipo de produção que eles tinham em 1500? O que os teria congelado neste momento, se nós mesmos os 'civilizamos'? O que justifica que essa cultura seja tratada da mesma forma que tratamos a japonesa, se não pior, uma vez que o japão é um grande país de primeiro mundo e os nossos indios são meros selvagens. O artesanato indigêna ainda é tratado assim por muitos. É o imaginario estagnado, paralisado em um momento do tempo por uma postura de não-participação, não-inclusão.
Ao partir da premissa imaginária que nós é ensinada em nossa educação formal onde o Brasil é o produto direto da mistura de três povos (Indios, Brancos e Negros), os indios primeiro são massificados em uma figura unica, como se fossem todos o Papa-Capim, personagem de Mauricio de Souza. Sua grande diversidade de nações e culturas é reduzida a Tupí-Guaraní. Seu momento histórico é o passado, e eles somem de nossos livros assim que os jesuitas os civilizam. Dessa forma, este é o único momento em que o Índio cabe no nosso imaginário.
Com esse entendimento da formação do imaginário brasileiro com relação ao índio, não é surpreendente que tenhamos tido defesa dessa cultura buscando estagna-la, paralisa-la naquele momento do Índio Ideal. O movimento mudava agora do processo civilizatório do índio para quase o oposto. É neste movimento que encontramos similariedade entre o tratamento dado a cultura indigena e a (assim chamada) cultura popular.

Criamos uma distância de ambas essas culturas apartir da dimensão tempo. Ambas pertencem ao passado. Tivemos primeiro vergonha delas, frutos de um passado selvagem embaraçoso, e então afastamos essa vergonha com o interesse antropologico e distante do estudioso que respeita as manifestações, embora ainda as classifique como inferiores, já que são fruto de um passado selvagem. Tradições para serem mantidas intactas e inalteradas, elas se encontram estagnadas. O que não torna surpreendente a afirmação do Movimento Manguebit, em pernambuco, de que a cidade se encontrava morta culturalmente no momento de nascimento deles.

Trazemos a tona então a nova forma de entendimento dessas culturas. Uma forma inclusiva, onde somos parte dela, não só por serem nosso passado, mas por estarem no nosso presente. Somos receptores e gestadores desta cultura. Assumimos a incapacidade de nos mantermos inalterados no tempo, e entendemos que cultura popular é construída apartir de elementos de nosso universo e podemos por tanto trazer elementos de nosso universo presente para dentro da cultura popular.

(notem, quando vocês escrevem um pedaço da sua monografia e falam do seu topico só no final do texto, essa é a hora que você entende que você tá viajando horrores)

1 Comments:

At 4:10 PM, Anonymous Anônimo said...

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